Portal de Eventos do IFRS, As (contra)reformas nas políticas educacionais no Brasil e seus impactos na Educação Profissional e Tecnológica

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A Educação de Jovens de Aduldos na perspectiva do currículo integrado como uma política inclusiva, de fato e de direito
Silvia Regina Montagner

Última alteração: 05-02-2024

Resumo


INTRODUÇÃO

Este estudo surge a partir da premissa do elevado número de evasão e baixa eficiência dos cursos da EJA no Instituto Federal Farroupilha, ao acompanhar esta modalidade a treze anos como Pedagoga da Instituição, tem-se a preocupação com a perpetuação desta oferta, que visa atender um público desassistido da sociedade, um público com baixa escolaridade, emprego precário, ou em situação de vulnerabilidade social, enfim, que estão à margem das políticas públicas. Por isso, manter a oferta destes cursos no IFFar, precisa ser visto como uma política de inclusão, de proporcionar qualificação profissional e elevação de escolaridade à Jovens e adultos que não tiveram acesso, ou tiveram insucesso no ensino regular na idade própria. Ao pensarmos a Educação de Jovens e Adultos temos que fazê-la retomando suas histórias cheias de perspectivas negativas, descontínuas, excludentes, essas perspectivas desqualificam o que os alunos trazem para o espaço tempo escolar, tanto no sentido da destituição de direitos, quanto suas experiências de luta pela vida. Por isso que ao pensar o currículo integrado, precisa-se pensar para além do ensino propedêutico ou simplesmente para as exigências do mercado de trabalho, mas pensar o currículo na totalidade, nas múltiplas dimensões da vida, da cultura, da ciência, da tecnologia e do trabalho. Castaman e Rodrigues (2020) reafirmam que o currículo integrado precisa ser visto como uma práxis que integre e promova o diálogo entre os diversos saberes. A partir desta reflexão este estudo tem como objetivo “Desvelar descritivamente como os docentes da Educação de Jovens e Adultos promovem sua prática pedagógica a partir do currículo integrado”. Quando se fala em formação integrada do ensino médio, busca-se que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional em todos os campos, focando o trabalho como princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho manual/trabalho intelectual. Como a formação humana é o princípio do currículo integrado, o que se busca é o direito deste jovem, adulto, trabalhador por uma formação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão pertencente a um país.

REFERENCIAIS TEÓRICOS

Os debates e produções sobre o currículo integrado ampliaram-se significativamente no Brasil especialmente a partir do ano de 2000, com a publicação do Decreto Lei Nº 5.154 de 2004 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional) o qual possibilitou a oferta do ensino técnico integrado com o ensino básico. O que desafia as instituições de ensino para pôr em prática o currículo integrado principalmente nas instituições federais de educação profissional e tecnológica. Estes desafios, partem dos diálogos sobre a compreensão e definição do currículo Integrado, tendo o trabalho como princípio educativo, pois nenhum conteúdo é só geral, nem somente só específico, os conceitos não podem ser formulados ou compreendidos desarticuladamente das ciências e das linguagens. Ramos (2019) coloca que esta formação integrada, propicia aos estudantes da classe trabalhadora, ter uma qualificação profissional como possibilidade de inserção no mundo do trabalho, como também condições de prosseguir nos estudos. Machado (2009) reforça a ideia que o currículo integrado deve estar atrelado a vida dos educandos, que suas experiências e conhecimentos, façam parte da formação técnica e tenha como pressupostos a compreensão do sujeito como ser histórico-social, a formação humana e o trabalho como princípio educativo, como objeto central das áreas do conhecimento. Portanto, é preciso construir um projeto de ensino médio que supere a dualidade entre formação específica e formação geral e tenha como foco a formação para a pessoa humana, “em que sujeitos dialógicos aprendem e crescem na diferença, sobretudo, no respeito a ela, é a forma de estar sendo coerentemente exigida por seres inacabados, assumindo-se como tais, se tornam radicalmente éticos”. (Freire, 1996, p.60). Ao considerar o sujeito da EJA dialógico e aprendente, busca-se um formato de ensino médio, que sejam contemplados as necessidades socioculturais e econômicas destes sujeitos.  Saviani (2017) complementa que precisa formar indivíduos autônomos, que tenham iniciativa e sejam conhecedores do seu meio, capazes de interferir ativamente na vida social. Reconhecendo-os como cidadãos trabalhadores, com princípios éticos, sobretudo comprometido com a emancipação humana. Para isso, professor e aluno deverão ser sujeitos do processo, ambos aprendem em comunhão, seja no diálogo, na amorosidade, inquietos e curiosos na busca pelo conhecimento, neste sentido a sala de aula se torna um espaço criativo e dinâmico, os conteúdos também se tornam mais significativos, principalmente quando o saber é produzido através da reflexão sobre a prática, “uns ensinam e, ao fazê-lo aprendem. Outros aprendem e, ao fazê-lo ensinam” (Freire,1992, p. 112). Ramos (2017) coloca que é necessário trazer para o espaço escolar uma formação que tenha unidade entre trabalho, ciência e cultura, estas dimensões são fundamentais para abordar conteúdos que são considerados essenciais para a classe trabalhadora. O que se vislumbra ainda mais para a EJA, que os conteúdos precisam implicar debates que favoreçam experiências sociais e políticas de sociabilidade e solidariedade.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para se chegar ao objetivo proposto, tem-se como aporte metodológico o paradigma interpretativo, de natureza qualitativa e análise descritiva. Para coleta de dados, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, com docentes e coordenadores de curso, distribuídos em nove campi com oferta de EJA, além das entrevistas foram realizadas análise documental dos documentos Institucionais, leis, resoluções e decretos Federais. Com o propósito de compreender a realidade, considera-se que o conhecimento não é neutro, está relacionado aos significados dos sujeitos em interação mútua e do sentido que dão para a cultura e as suas peculiaridades do cotidiano vivenciado no fenômeno educacional. A pesquisa está inserida em um cenário educativo concreto que busca compreender, conhecer e atuar frente aos desafios postos que é trabalhar na perspectiva do currículo integrado. No paradigma interpretativo o conhecimento tem seu embasamento na interação sujeito-objeto, com a finalidade de aprofundar e compreender a conduta dos colaboradores do estudo e assim estar mais próximo para interpretar os significados, ações e pensamentos que envolvem a instituição de ensino. Este envolvimento de comunicação entre a pesquisadora e o entrevistado é importante para se chegar ao objeto de estudo, com o objetivo de aprofundar o conhecimento e a compreensão da realidade educacional pesquisada. Sandin (2003, p.34) coloca que a “finalidade da investigação é compreender e interpretar a realidade, os significados e as pessoas, percepções, intenções e ações”.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para a EJA a relação entre mundo do trabalho e educação discorre de forma muito mais rápida, quando ingressam na escola buscam conhecimentos que os ajudem na sua vida, para eles o trabalho faz parte do seu cotidiano, e tratar destes temas no currículo é tão necessário para que desenvolvam o pensamento reflexivo construído a partir das experiências que possuem, que são oriundas das relações estabelecidas no decorrer da vida. Diante do exposto, o currículo integrado busca formar os sujeitos para promoção da autonomia, da criticidade, propicia a flexibilização curricular, a partilha de vivencias e a ampliação do diálogo entre as diferentes áreas. Para isso, toda comunidade escolar precisa trabalhar em colaboração, para que possam ampliar o diálogo com o mundo do trabalho e assim atender aos interesses e necessidades dos sujeitos, para que percebam a Instituição como um espaço formativo, que possibilita através da qualificação profissional, acesso a oportunidades profissionais, com uma formação pautada no respeito, no diálogo e no comprometimento. Para isso, precisa-se superar a fragmentação dos currículos e pensar nos sujeitos de conhecimento, com experiências formativas construídas a partir do seu cotidiano. A partir deste pressuposto busca-se a capacidade de compreensão a sua volta, cada um com suas experiências incorporam uma construção coletiva de saberes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a presente proposição, surge a possibilidade de minimizar a organização disciplinar, para uma organização “interdisciplinar”, a qual proporciona interligações mútuas na produção de saberes, imbuídos de aproximar conteúdos curriculares, metodologias e professores, na produção de novos conhecimentos e a compreensão diferenciada da realidade da EJA no IFFar. A interdisciplinaridade evidencia mudança na prática pedagógica, propicia a conexão entre as disciplinas através de um trabalho cooperativo e solidário. (Silva, 2017) Para o público da EJA, as disciplinas isoladas não oferecem subsídios satisfatórios aos problemas atuais, no entanto trazer o movimento interdisciplinar é uma forma de promover o diálogo entre os conhecimentos, pois considera-se que nenhuma área do conhecimento é completa por si só. Desta maneira o trabalho coletivo possibilita pensar ações para superar a disciplinaridade orientada a uma “Prática Profissional Integrada”, prevista no Projeto Pedagógico do curso, que “objetiva articular horizontalmente os conhecimentos dos três anos do curso oportunizando o espaço de discussão e entrelaçamento entre as disciplinas com a finalidade de incentivar a pesquisa como princípio educativo promovendo a interdisciplinaridade” (Projeto Pedagógico do Técnica em Estética, 2020, p.32) Ainda na prática profissional integrada, “o ensino integrado é um projeto que traz um conteúdo político-pedagógico engajado, comprometido com o desenvolvimento de ações formativas integradoras” (Araújo e Frigotto, 2015, p.63) Estas ações promovem a autonomia dos sujeitos com práticas pedagógicas que ampliam os conhecimentos tanto dos alunos como dos docentes.

REFERÊNCIAS

Araújo, R. M. L., & Frigotto, G. Práticas pedagógicas e ensino integrado. Revista Educação em Questão, 52(38), 61-80. 2015 https://doi.org/10.21680/1981-1802.2015v52n38ID7956

Castaman, A. S., & Rodrigues, R. A. Ensino integrado: perspectivas e provocações. Revista Educação e Emancipação, 13(2), 133-151.2020 https://doi.org/10.18764/2358-4319.v13n2p133-151

Ciavatta, M. A formação integrada: a escola e o trabalho como lugares de memórias e de identidade. In G. Frigotto, M. Ciavatta, & M. N. Ramos. Ensino médio integrado: concepções e contradições (pp. 83-105). São Paulo, Cortez, 2005.

Decreto n. 5.154 de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Brasília, D, 2004. Recuperado de https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5154.htm

Freire, P. Pedagogia da esperança um reencontro com a Pedagogia do Oprimido (15a ed.). Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1992.

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Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha. Projeto Pedagógico do Curso Técnico em Estética Integrado EJA-EPT (PROEJA). Santo Ângelo, RS, 2020b Recuperado de https://www.iffarroupilha.edu.br/projeto-pedag%c3%b3gico-de-curso/campus-santo-%c3%a2ngelo

Machado, L. R. S. Ensino médio e técnico com currículos integrados: propostas de  ação  didática  para  uma  relação  não  fantasiosa.  In J. Moll (Org.). Educação profissional e tecnológica no Brasil contemporâneo: desafios, tensões e possibilidades (1a ed., pp. 1-17). Porto Alegre, Artmed, 2009.

Ramos, M. N. Ensino médio integrado: lutas históricas e resistências em tempos de regressão. Educação Profissional e Tecnológica em Revista, 1(1), 27-49, 2017. https://doi.org/10.36524/ept.v1i1.356

Ramos, M. N. Ensino Médio no Brasil contemporâneo: coerção revestida de consenso no “estado de exceção”. Nova Paideia, 1(1), 2-11, 2019. https://doi.org/10.36732/riep.v1i1.19

Sandín, M. Investigación cualitativa en educación. fundamentos y tradiciones. Madrid: Mc Graw Hill, 2003.

Saviani, D. (2017). Democracia, educação e emancipação humana: desafios do atual momento brasileiro. Psicologia Escolar e Educacional, 21(3), 653-662. https://doi.org/10.1590/2175-353920170213000

Silva, M. O. A interdisciplinaridade como uma possibilidade no processo de ensino aprendizagem da educação profissional de nível tecnológico para o mundo do trabalho. Revista Brasileira de Educação Profissional e Tecnológica, 2(13), 13-30, 2017. https://doi.org/10.15628/rbept.2017.4766


Palavras-chave


EJA/EPT; Currículo Integrado; Inclusão; Política

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