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“Uma taça de vinho por dia faz bem”. Essa é uma crença enraizada em nossa cultura. Por exemplo, a água convertida milagrosamente em vinho nas mãos de Jesus Cristo na Santa Ceia representaria o Seu sangue e a pureza como elemento catalisador da espiritualidade essencial. Por outro lado, a maconha, objeto de estudo em nosso projeto de pesquisa, é vista desde o início do século XX até os dias atuais como uma planta perigosa de natureza “demoníaca”. No entanto, a pesquisa realizada por nós indica que o álcool presente nas bebidas alcoólicas é uma droga consideravelmente mais pesada e nociva que a maconha, tanto no potencial de intoxicação, como no desenvolvimento de dependência, assim como causa de danos a terceiros. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é problematizar o tratamento contraditório com as evidências científicas que o álcool (legalizado) e a maconha (criminalizada) recebem em nossa sociedade a partir da apresentação enfática dos malefícios causados pelo consumo de bebidas alcoólicas, um mal que se tornou invisível em nossa sociedade. O método consistiu em uma revisão bibliográfica narrativa de artigos científicos, publicados em revistas com classificação Qualis Capes entre B3 e A1 em português e inglês que tratavam dos malefícios do álcool. Os resultados indicam que o consumo de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de mortes no mundo, tendo causado a morte de 2,6 milhões de pessoas no mundo, e 91,9 mil pessoas no Brasil no ano de 2019, a Organização Mundial da Saúde. Ou seja, 4,6% de todas as mortes no mundo e 6,8% de todas as mortes no Brasil no ano de 2019 foram causadas pelo consumo de bebidas alcoólicas. No caso do Brasil, considerando o valor conservador de 1%, o custo dos danos causados pelo álcool podem chegar a R$110 bilhões/ano. Mais de 30 doenças podem ser creditadas ao uso de álcool como causa direta. Entre os principais danos associados estão doenças gastrointestinais, neoplasmas malignos (tumores e câncer), transtornos por uso de álcool, doenças infecciosas, doenças cardiovasculares, diabetes mellitus e epilepsia. O álcool também é co-causador de transtornos psicológicos e psiquiátricos, como depressão, ansiedade, transtornos de personalidade e quadros psicóticos. Seu uso também está associado a um maior risco de acidentes e violência no trânsito. Além disso, há evidências científicas de que o álcool é a verdadeira porta de entrada para outras drogas e seu consumo na adolescência é preditor de condenações criminais variadas na vida adulta. Frente a estas contradições entre o que ciência evidencia sobre os efeitos do consumo das duas substâncias e o tratamento social e jurídico que ambas recebem em nossa sociedade, questionamos, para futuras investigações, quais forças e interesses produzem essa realidade incoerente?

Maconha; Álcool; Legalização