Transformações socioculturais, geopolíticas, históricas e epistêmicas vêm provocando mudanças estruturais nas sociedades, fragmentando paisagens culturais e configurando novas pertenças. Impulsionados pelos Estudos Culturais e Pós-coloniais, grupos considerados minoritários vêm reivindicando espaço e voz, caso dos negros que foram subjugados e tiveram suas histórias escritas pela voz do Outro. É nesse cenário que a literatura, enquanto produto cultural, tem desempenhado importante papel, oportunizando que esses sujeitos se tornarem agentes e produtores de suas próprias histórias. Diante disso, este estudo investiga títulos sobre temáticas culturalmente identificadas com as problemáticas negras, especificamente os produzidos por escritores negros nas duas últimas décadas no estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista a pouca representação dessa parcela da população na literatura brasileira. Promover esse estudo é subverter a lógica colonialista racial que perdurou por muito tempo no meio acadêmico e promover a decolonização do pensamento. Assim, objetivamos investigar quem são os sujeitos autores dessa literatura, compreender quais são suas produções, que tipo de representações vem sendo construída e quais são as problemáticas envolvidas. Para tanto, selecionamos apenas autores gaúchos, que se predicam negros, e publicaram alguma obra nos últimos vinte anos (2000-2020). Para realizamos o levantamento, buscamos informações em revistas especializadas, sites e páginas pessoais, bem como materiais de divulgação de lançamentos de obras, eventos etc. Os resultados obtidos até o momento ainda são parciais, contudo podemos afirmar que, mesmo que tenha havido uma abertura (tardia) do mercado editorial hegemônico para a produção de escritores negros e para a representação ficcional dessas populações historicamente marginalizadas, os textos em prosa (romances, contos, etc.) têm um número menor que os de poesia, revelando que narrativas mais extensas ainda são pouco produzidas. A poesia assume um lugar de maior destaque, talvez, pelo formato menor e menos custoso, ou ainda, por evidenciar um valor estético mais apreciado. Outro fator identificado foi o aumento de editoras independentes e coletivas, compostas por sujeitos pertencentes a esses grupos étnicos ou por indivíduos que perceberam que esse estrato literário ganhou maior espaço e consumidores. Ao analisarmos as produções dos escritores negros gaúchos foi possível identificar que um nicho mercadológico está se estabelecendo, sugerindo que os investimentos recentes em políticas públicas voltadas para o coletivo negro proporcionaram um efeito protagonizante que acionou uma representatividade, até então, pouco explorada ou encenada por literatos brancos que emprestaram suas vozes a personagens e situações, mas não poderiam ter a autoridade advinda das vivências dessas populações.