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Colonialismo: os efeitos e os “filhos” gerados
Mariana Luisa Schaeffer Brilhante, Cassiana Grigoletto

Última alteração: 14-09-2018

Resumo


O presente trabalho analisa a estrutura narrativa e os aspectos temáticos dos contos “Tio, mi dá só cem” e “O feto”, que integram a obra Filhos da Pátria (2008), do escritor angolano João Melo. Tal estudo vincula-se ao projeto de pesquisa intitulado As construções identitárias da africanidade nas literaturas de língua portuguesa, que possui financiamento do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica e/ou Tecnológica (PROBICT) e Auxílio Institucional à Produção Científica e/ou Tecnológica (AIPCT) e objetiva analisar as construções identitárias da africanidade nas literaturas de língua portuguesa, observando seus processos de transculturação, efeitos da colonialidade do poder e/ou mecanismos de descolonização. Por compreender a literatura como um produto cultural que, cada vez mais, exige uma reflexão sobre os modos de (re)articulação dos tecidos narrativos, os elementos culturais formadores de identidades e as relações de poder que os constituem, aspectos ainda mais significativos nos contextos africanos ou afrodescendentes, pois a literatura tem desempenhado um importante papel na escrita da identidade cultural e histórica de seus povos, é que procedemos a seleção do corpus literário para análise. O livro de contos Filhos da Pátria (2008) revisita Angola, país que teve sua independência apenas em 1975, com seus dilemas políticos, históricos, culturais e sociais, e engendra a discussão sobre a multiplicidade de identidades no país, as quais emergem a partir do sujeito colonizado e não mais de seu colonizador, tornando-os sujeitos de sua própria história. Dessa forma, ancorada nas teorias dos Estudos Culturais e Pós-Coloniais (HALL, 2011; QUIJANO, 1989; LEITE, 2011), a presente pesquisa investiga os bens simbólicos representados nessas narrativas pós-coloniais, procurando desvelar os contínuos efeitos da colonialidade do poder gerados pelos processos de colonização. Aníbal Quijano cunha o conceito “colonialidade do poder” em 1989 ao defender que a lógica eurocêntrica produzida durante o colonialismo para subjugar o “outro”, inferiorizando os negros e os ameríndios, ultrapassa as esferas políticas e econômicas e atinge ainda hoje as culturas e estruturas do que Mignolo (2003, p. 30) chama de “sistema-mundo capitalista moderno/colonial”. Nesse sentido, o presente estudo aponta para uma prática de descolonização da episteme eurocêntrica, gerando o que Walter Mignolo concebe como “pensamento liminar”, o qual vem redefinindo a geopolítica do conhecimento. Atualmente, a temática sobre o ensino de literatura e as relações etnorraciais perpassam a formação profissional dos cursos de licenciatura em Letras e, consequentemente, integram as políticas e referências em ações afirmativas nas diferentes instituições de ensino. No contexto atual, de práticas formativas fragmentadas e da presença de movimentos de segregação na sociedade é imperativo o combate às diferentes formas de preconceito e de exclusão social. Nesse sentido, a inserção da literatura africana e suas temáticas afirmativas na formação e difusão do conhecimento é uma prática pedagógica importante, principalmente a partir da Lei 10.693 que prevê a obrigatoriedade do estudo da História e Cultura Afro-Brasileira nos currículos da educação básica, que visa quebrar o aparato de dominação e representação literária por grupos sociais hegemônicos. Por meio de uma metodologia qualitativa e uma abordagem exploratória, as ações desenvolvidas por esse projeto integram etapas que envolveram a seleção do corpus literário para a análise, a investigação e apropriação de conceitos teóricos e críticos e, por fim, o trabalho de seleção de fragmentos textuais para os procedimentos de escrita interpretativa e analítica. Durante todo o processo, foi necessário adotar uma perspectiva descritiva, relacional, comparatista e transdisciplinar, exigência das próprias proposições teóricas dos Estudos Culturais e Pós-Coloniais, que sustentam a presente proposta de estudo. A partir de uma análise comparativa entre as histórias narradas nos respectivos contos, os quais apresentam personagens que lutam pela sobrevivência em meio à miséria e abandono social, observa-se a representação identitária dos filhos que a “pátria” angolana tem gerado, produtos dos processos socioculturais, políticos e históricos da colonização. Valendo-se das teorias pós-coloniais, observa-se os efeitos políticos da colonialidade do poder e as representações identitárias angolanas nas literaturas africanas de língua portuguesa. Como resultado parcial do projeto, é possível apontar que a crítica à sociedade e às pessoas que a constroem, ficcionalizada nos contos, delineiam importantes opções para pensar a constituição das africanidades. Baseado nisso é importante ressaltar que, guardada as devidas proporções, podemos, a partir disso, pensar a importância das literaturas africanas para o combate a redução das desigualdades de toda ordem, e como os resultados desse tipo de pesquisa podem influenciar fortemente as periferias das grandes cidades e as narrativas que constituem esses espaços de exclusão social, caso específico da Restinga.

REFERÊNCIAS

HALL, Stuart.  Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2011.

LEITE, Ana Mafalda. Oralidades & Escritas Pós-Coloniais: estudos sobre literaturas africanas. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012.

MELLO, João. Filhos da Pátria. Rio de Janeiro: Record, 2008.

MIGNOLO, Walter. Histórias locais, projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

QUIJANO, Aníbal. Modernidad, Identidad y Utopía en América Latina. Quito: Ediciones El Conejo, 1989.


Palavras-chave


Angola; Identidade; Pós-colonialismo

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