Portal de Eventos do IFRS, 9º SALÃO DE PESQUISA, EXTENSÃO E ENSINO DO IFRS

Tamanho da fonte: 
O agro é tech? uma análise documental da proteção de dados de testes submetidos às entidades governamentais para aprovação da comercialização de agrotóxicos
Larissa Pierozan, Kelly Lissandra Bruch

Última alteração: 17-12-2024

Resumo


Os dados de testes são importantes ativos para as organizações que elaboram produtos cuja comercialização depende da aprovação estatal. A proteção desses dados tem origem no capítulo de proteção de informações confidenciais do Acordo Sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (ADPIC). Em âmbito nacional, assegura-se a proteção por meio da vedação à concorrência desleal, especificamente, contra a divulgação, exploração ou utilização desses dados sem a autorização de seu titular (art. 195, XIV, da Lei 9.279/1996). Discute-se a amplitude desta proteção frente à comercialização de produtos genéricos. No Brasil, na área farmacêutica, permite-se que medicamentos genéricos demonstrem que possuem equivalência farmacêutica e bioequivalência (Resolução n. 16/2007, Anvisa) aos medicamentos de referência.  Assim, para o registro do medicamento genérico, não há a necessidade de submissão dos testes de eficácia, segurança e qualidade, pois eles já foram submetidos para a aprovação do medicamento de referência. Já, na área dos agrotóxicos, existe legislação prevendo um período de uso exclusivo dos dados submetidos para aprovação da comercialização destes produtos, a Lei 10.603/2002. Deste modo, terceiros que visem registrar um agrotóxico genérico terão de refazer os testes, se não tiverem a autorização do titular do agrotóxico de referência durante o período de proteção. Em que pese a discussão sobre a proteção por tempo exclusivo dos dados de testes ser amplamente debatida em âmbito dos fármacos, há uma escassez de publicações no âmbito dos agrotóxicos. Ainda que exista literatura sobre a proteção dos dados de testes para agrotóxicos, seu conteúdo restringe-se à exposição dos aspectos jurídicos da proteção conferida. Além disso, o procedimento de registro de agrotóxicos recentemente foi alterado pela Lei 14.785 de 27 de dezembro de 2023, revogando a legislação anterior, a Lei 7.802 de 11 de julho de 1989. A nova legislação prevê a dispensa de apresentação de estudos de eficiência e de praticabilidade para produtos formulados e produtos formulados com base em produto técnico equivalente (produto genérico) quando tiverem o mesmo tipo de formulação, mesmas indicações de uso e modalidades de emprego já registrados a de um produto técnico já registrado (art. 3º, § 11, Lei 14.785/2023). Referidos produtos também são dispensados de apresentar os estudos de resíduos quando além dos dois requisitos mencionados anteriormente, também tiverem intervalo de segurança igual ou superior a um produto formulado já registrado (art. 3º, § 13, Lei 14.785/2023). Entretanto, nenhuma das disposições menciona a proteção dos dados de testes ou faz menção à Lei 10.603/2002 ou, no presente momento, foram publicadas outras normas regulando a Lei 14.785/2023 que façam menção a proteção dos dados de testes. Importante ressaltar que, diferentemente do registro de medicamentos que é apenas analisado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a provação do registro de agrotóxicos depende de três entidades governamentais: O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Anvisa. A nova legislação de registro de agrotóxicos trouxe algumas alterações na dinâmica de competências e aprovações dos registros entre as três entidades governamentais, o que também pode afetar como essas entidades tratam e avaliam os dados de testes que lhes são submetidos. Nesse contexto, questiona-se como se dá a proteção dos dados de testes? Todos os dados são protegidos? Eles podem ser publicizados? Se sim, como isso seria feito? Como é garantido o sigilo desses dados? Como esses dados são tratados pelas entidades governamentais que os recebem? Deste modo, o objetivo da pesquisa é compreender como ocorre a proteção de dados de testes submetidos às entidades governamentais para aprovação da comercialização de agrotóxicos no Brasil. Para atingir esse objetivo, será adotada uma abordagem qualitativa e de caráter exploratório. A pesquisa será dividida em duas etapas. Na primeira etapa, de coleta de dados, será adotada técnica de pesquisa documental. Na segunda etapa, será realizada a análise e interpretação dos dados coletados. A pesquisa documental é constituída “por qualquer objeto capaz de comprovar algum fato ou acontecimento” (Gil, 2022, p. 45). Deste modo, por meio desta técnica, procura-se selecionar documentos que elucidem o procedimento de registro de um agrotóxico, em especial, identificar os procedimentos de submissão e tratamento dos dados de testes, quais os dados submetidos e como são avaliados pelas entidades governamentais. Assim, além da legislação que normatiza o procedimento, serão buscados documentos elaborados pelas próprias entidades governamentais, como normativas, guias ou manuais. Serão considerados documentos elaborados por organizações internacionais, cujos parâmetros sejam seguidos pelas entidades federais nacionais durante o registro. Também serão buscados documentos produzidos pelas organizações que pesquisam e comercializam agrotóxicos e as associações que atuam no ramo de agrotóxicos. Os documentos localizados serão selecionados e organizados conforme seu conteúdo. O procedimento de análise desses documentos será pela análise de conteúdo, que se trata de um “conjunto de técnicas de análise das comunicações” (Bardin, 2016, p. 37). Além das três entidades governamentais responsáveis pela aprovação do registro no Brasil, considerou-se também a principal agência dos estados Unidos da América responsável por regular agrotóxicos (Environmental Protection Agency – EPA) e as normas da Comissão e do Parlamento Europeu, aplicáveis aos países que compõem a União Europeia.  Para pesquisa de associações que produzam documentos relevantes para atingir o objetivo da pesquisa, foi utilizada a ferramenta de busca do Google e o Mapa das Organizações da Sociedade Civil disponibilizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Na base do Ipea, foi utilizado o filtro para área de “Associações patronais, profissionais e de produtores rurais”. Em ambas as ferramentas de pesquisa, utilizou-se a combinação das chaves de pesquisa “associação” e “agrotóxico” ou “fitossanitário”, ou “pesticida”, ou “defensivo agrícola”. A presente pesquisa ainda está na fase de coleta de dados. Dito isso, como resultados esperados, pretende-se discriminar os dados solicitados e verificar se há dados que não necessariamente são protegidos. Além disso, identificar como é garantido o cumprimento da proteção por período exclusivo dos dados do produto de referência pelas entidades governamentais e quais as medidas tomadas para garantir o sigilo dessas informações pelas organizações que pesquisam e comercializam agrotóxicos. Embora a norma seja pela proteção, nada impede que os titulares dos direitos sobre os dados de testes autorizem terceiros de acessá-los e os utilizarem para obtenção do registro do agrotóxico, ainda que sob caráter oneroso. Deste modo, a publicização dos dados também pode ser uma importante fonte de informação para concorrentes quanto a investir na fabricação daquele agrotóxico ou investir no desenvolvimento de alternativas. O compartilhamento de informações, em oposição a uma demasiada proteção de informações confidenciais, pode ser um mecanismo de inovação e progresso das organizações e economia nacional (Radauer; Searle; Bader, 2023). Por esse motivo, compreender o atual sistema de proteção é importante para uma análise dos impactos concretos e no aproveitamento de oportunidades pelas organizações em uma visão econômica e de desenvolvimento nacional, que é justamente o objetivo da proteção dos direitos intelectuais (art. 5º, inciso XXIX, da Constituição Federal de 1988).  A pesquisa a ser realizada pretende ampliar o debate da proteção de dados de testes submetidos às entidades governamentais para a área dos agrotóxicos. Além disso, desmistificar e trazer maior transparência em como esses dados são tratados pelas entidades governamentais que os recebem e pelas organizações que os submetem.


Palavras-chave


Pesticidas; Propriedade Intelectual; Informações Confidenciais.

Texto completo: PDF