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“It's just a burning vinyl” lembrança e esquecimento de samples sonoros na obra de The Caretaker
André Santos Marchese, Marcelo Bergamin Conter

Última alteração: 22-12-2023

Resumo



The Caretaker é um projeto do músico inglês Leyland Kirby. Sob essa alcunha, o artista produz composições que são remixagens de peças musicais de ballroom, gênero popular em meados dos anos 1930. A obra mais famosa do artista é Everywhere At The End Of Time (2016-2019). Nota-se uma construção diegética que remete a um filme de suspense na paisagem sonora, que é intensificada por meio das capas de cada volume e seus respectivos nomes, como Surrendering to Despair, ou Misplaced In Time, além da presença de “estágios” no álbum que exploram metaforicamente o processo de deterioração mental em um indivíduo com Alzheimer e/ou demência. Conforme se avança na escuta do álbum, as composições são sobrepostas por interferências, como o uso de plugins que simulam craquelados de vinil e cortes de frequências de aparelhos analógicos e que progridem ao longo da obra até que soterram as peças de ballroom na mixagem, evocando agenciamentos de baixa definição (CONTER, 2016). Interessa-nos compreender as semioses provenientes desse resgate de trechos de música de salão do século passado, pois o advento da música pop é concomitante com a popularização do disco de vinil. Trata-se de um resgate dessa memória, não só do princípio da música pop como conteúdo, mas também em sua forma: o vinil. A presença sônica dos ruídos simulados de mídias obsoletas intensificam a sensação de envelhecimento da música popular. Mas se passado se acumula no presente, já dizia Bergson (2006), então esses são sons do presente, porque revisitados e atualizados para uma outra finalidade. Concluímos que a lenta progressão em direção ao ruído branco pode ser uma metáfora não só para a demência, mas para o futuro do pop. Reynolds propõe que com o advento da internet, a música pop passou a se auto referenciar. É resultado da memória total produzida pelo armazenamento aparentemente infinito de dados que a internet proporciona. Apesar de focar na compreensão do álbum como uma metáfora ao processo de demência que Kirby e a maioria dos críticos musicais estabelecem, como se a deterioração, desconstrução e desmanchamento de samples sonoros do Século passado representassem o recrudescimento da memória de um ser humano, nós preferimos estabelecer uma outra relação paradigmática diante da obra: ao invés de pensá-la como uma tradução intersemiótica de uma condição de saúde mental para a música, pretendemos especular o que esta obra diz da própria história da música popular, como um procedimento metassemiótico que problematiza o papel do sampling e da remixagem na história da fonografia. Para tanto, empreendemos uma metodologia cartográfica das sonoridades, mapeando os samples utilizados e compreendendo como eles vão sendo reempregados em diferentes contextos ao longo da obra.


Palavras-chave


Semiótica; Música ambiente; Memória.

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