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A gênese da Escola de Viticultura e Enologia a partir dos discursos imprensa regional (1940-1960)
Caroline Cataneo, Dóris Bitencourt Almeida

Última alteração: 22-12-2023

Resumo


A presente comunicação analisa aspectos de uma investigação maior que está sendo desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEdu/UFRGS) na área de História da Educação. Pretende-se, neste estudo, analisar de que maneira os discursos em prol da Escola de Viticultura e Enologia – atual Campus Bento Gonçalves do IFRS – circulavam pela imprensa local nas décadas anteriores à sua implantação, no ano de 1959. Para Magalhães (2004), a história de uma instituição educativa inicia-se não somente com a instituição em si, mas sim a partir da conjuntura sociocultural que promoveu sua emergência.  Uma vez que a educação profissional é o lócus mais visível da educação pelo trabalho, conforme pontua Ciavatta (2015), a utilização da imprensa local para analisar o contexto que culminou na inauguração da escola no ano de 1959 é salutar para conhecer as entidades – políticas, econômicas e sociais – envolvidas no processo. Para dar conta desse objetivo, faz-se uso da análise documental histórica aplicada aos períodos e à imprensa, especialmente a partir das contribuições de Capelato (1988) e De Luca (2018). Em relação à história da educação profissional e especialmente ao ensino profissional agrícola, utiliza-se as proposições de Manfredi (2016) e Koller e Sobral (2010).

A pesquisa foi realizada utilizando três jornais: A Época, O Pioneiro e Jornal Do Dia todos de um período anterior à implantação da Escola de Viticultura e Enologia na cidade de Bento Gonçalves/RS. A busca foi realizada nos sítios eletrônicos da Hemeroteca Digital do acervo da Câmara Municipal de Caxias do Sul pelos descritos “escola de enologia”, “enologia” e “viticultura”. A partir deste exame inicial, foram selecionados 16 volumes de jornais. Para a análise dos periódicos foram utilizadas as proposições de Capelato (1988) e De Luca (2018) como base teórica, buscando realizar uma articulação com a história da educação profissional e, especialmente do ensino profissional agrícola, do período delimitado.

A emergência da profissão de Técnico em Enologia está diretamente relacionada com necessidade que culminou na implantação da Escola de Viticultura e Enologia na cidade de Bento Gonçalves, no ano de 1959. Para Ciavatta (2015, p. 49), “são as fontes que revelam os acontecimentos e permitem a construção do discurso histórico”. Nesse sentido, e a partir das proposições de Capelato (1988), o uso da imprensa em pesquisas de históricas é relevante pois ela representa determinadas práticas sociais de uma época, além de serem considerados “enciclopédias do cotidiano”, contendo “fragmentos do presente”, nas ideias de De Luca (2018).

No jornal “A Época” a menção à necessidade de profissionalização no mundo do vinho aparece em matérias publicadas na década de 1940, especialmente demandadas por associações de viticultores que aumentam passam a cultivar variedades de uvas finas e necessitam de apoio para qualificar seu trabalho.  O ano de 1950 é especial para a vitivinicultura no estado com o V Congresso Brasileiro de Viticultura e Enologia realizado na cidade de Caxias do Sul/RS. Na solenidade foi lançada a pedra fundamental da “futura Escola Prática de Viticultura e Enologia” que seria construída em Caxias do Sul. Na mesma matéria, é apontada que a criação de uma escola de educação profissional agrícola com a finalidade de formar enólogos já estava sendo amplamente solicitada ao governo federal e estadual há bastante tempo. Nos anos de 1957 e 1958, no jornal “O Pioneiro” há menções à cursos rápidos que foram realizados na Estação Enológica de Caxias do Sul para viticultores locais.

No “Jornal do Dia”, de Porto Alegre, na edição de 1º de novembro de 1956, o Secretário de Agricultura do estado, Orlando Carlos da Cunha, é entrevistado e apresenta o andamento do trabalho que vinha sendo realizado em prol da escola. Representantes do Serviço do Vinho foram escalados para obter informações sobre outras escolas de formação de enólogos na Itália, na Argentina e no Uruguai a fim de elaborar o projeto do curso de formação de enólogos. O jornal ainda questiona o secretário sobre o local de implantação da escola: “o estudo da região produtora recomenda a instalação da futura Escola na cidade de Bento Gonçalves, por ser o centro da mesma e porque estará situada junto à Estação Experimental de Vitivinicultura e Enologia subordinadas ao governo federal.” Dessa forma, é possível inferir que, alguns anos antes da lei de criação da escola, já havia disputas políticas em torno de seu local de instalação na serra gaúcha, na cidade de Caxias do Sul ou Bento Gonçalves. Porém, a partir de 1956 o local para a instalação da escola é escolhido e a escola passa a formar os primeiros profissionais na área do Brasil.

Os jornais apresentam-se como valiosas fontes de informação para conhecer a história local e para pesquisas em história da educação. Nesse caso, a utilização da imprensa e a análise do contexto social e educacional do período, evidencia que a instituição foi criada a partir das necessidades dos produtores locais que, organizados em entidades de classe, solicitaram apoio para políticos e empresas em prol de uma escola que formasse enólogos, profissão até então inexistente no país. Para Manfredi (2016), as profissões emergem a partir da complexificação e transformação das atividades produtivas, o que pode ser visto a partir dos esforços em prol de uma escola de educação profissional criada para este fim.

Para Magalhães (2004), a história de uma instituição educativa corresponde a relações entre as culturas gerais e locais, normas e atitudes grupais, institucionais e organizacionais. Em outras palavras, é impossível isolar uma instituição escolar do contexto em que ela é criada. No caso da Escola de Viticultura e Enologia, criada oficialmente por meio da Lei n. 3.646 em 22 de outubro de 1959 não é diferente. Sua criação é parte de uma luta de diferentes entidades em prol da educação profissional agrícola: produtores, entidades de classe, organizações e políticos. Além disso, o contexto de emergência da profissionalização no campo, como apontam Koller e Sobral (2010) e as mudanças ocorridas no capitalismo brasileiro não podem ser esquecidas nesse contexto.

 

REFERÊNCIAS

CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e História do Brasil. São Paulo/SP: Contexto/EDUSP, 1988.

CIAVATTA, Maria. O trabalho docente e os caminhos do conhecimento: a historicidade da Educação Profissional. Rio de Janeiro: Lamparina, 2015.

LUCA, Tania Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2018, p. 111-153.

KOLLER, Cláudio. SOBRAL, Francisco. A construção da identidade das escolas agrotécnicas federais: a trajetória da COAGRI ao CONEAF. In: MOLL, Jaqueline (org.). Educação profissional e tecnológica no Brasil contemporâneo: desafios, tensões e possibilidades. Porto Alegre: Artmed, 2010. p. 220-230.

MAGALHÃES, Justino de. Tecendo nexos. História das instituições educativas. Editora Universitária São Francisco-EDUSF, 2004.

MANFREDI, Silvia Maria. Educação profissional no Brasil: atores e cenários ao longo da história. Paco Editorial, 2017.


Palavras-chave


História da Educação Profissional; História da Educação; Escola de Viticultura e Enologia.

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