O presente trabalho é inspirado em um dos encontros realizados no projeto de extensão intitulado Conversas literárias desenvolvido no Instituto Federal do Rio Grande do Sul - Campus Bento Gonçalves - cuja essência é ler contos e compartilhar, oral e coletivamente, discussões a partir da análise feita pelos participantes. Entende-se que a leitura e interpretação de textos literários, principalmente quando realizada de forma conjunta, amplia a compreensão do contexto da obra e da própria realidade do leitor. Assim, o objetivo desta análise é descrever a experiência de leitura coletiva do conto O menino que escrevia versos, de Mia Couto, e pontuar as interpretações construídas e compartilhadas pelo grupo de participantes. Os encontros do projeto são realizados quinzenalmente e abertos à comunidade interna e externa do campus. Um conto é escolhido, antecipadamente, e sua leitura é realizada na hora do encontro. No ano de 2022, um dos textos lidos no grupo foi O menino que escrevia versos cuja narrativa trata do drama de uma família que busca ajuda médica e tratamento para o único filho do casal. O garoto tende a enxergar o mundo de forma lírica, comportamento que não é bem visto pelos seus pais. O médico, diferentemente do pai do menino, embora tenha sugerido a internação, o faz por perceber que tal estado não configura doença e sim cura, devido à produção poética do paciente. Após a leitura em voz alta do conto, abriu-se o espaço para que os participantes manifestassem suas percepções e construíssem relações possíveis. Para ilustrar alguns pontos levantados no encontro, destaca-se a forma poética e artística como o menino via o mundo, muito distante daquela demonstrada por seu pai, um mecânico com pouca instrução formal, que definia seu entorno sempre através dos elementos de sua profissão, como se tudo pudesse ser resolvido de modo pragmático. Apesar da aversão à poesia, o pai do menino utilizou diversas analogias que podem ser observadas ao longo do texto, associando situações e objetos do seu cotidiano para expressar em palavras os seus sentimentos, manifestando, assim, poesia de forma inconsciente. Outra questão importante apontada foi em relação às intenções do médico: seriam elas egoístas, no sentido de manter a arte do garoto para si, no hospital, ou preservadoras, no sentido de valorizar os versos que não chegaram a ser reconhecidos pela família? Essas inquietações mobilizaram a leitura de grupo e demonstraram a potencialidade da literatura sobre nossas percepções de mundo. Diante do diálogo construído no encontro, pode-se dizer que o projeto reafirma sua importância para o desenvolvimento pessoal e acadêmico dos integrantes, que se reconheceram nas relações sugeridas tanto pelo menino, que escrevia versos, como naquelas indicadas pelo pai, que vinculava os escritos do filho a um estado de enfermidade.