Última alteração: 21-11-2022
Resumo
Introdução:
A história da Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no Brasil foi permeada pela dualidade de classes. Políticas públicas desconectadas da formação humana e preocupadas apenas com a moralidade, acentuaram a divisão de classes no Brasil. Segundo Moura (2007), no Brasil,
“[...] A EPT tem, portanto, a sua origem de uma perspectiva assistencialista com o objetivo de “Amparar os órfãos e os demais desvalidos da sorte” (...)
Essa lógica assistencialista com que surge a educação profissional é perfeitamente coerente com uma sociedade escravocrata originada de forma dependente da coroa portuguesa. (MOURA, 2007, p.3).
A Lei Nº 9.394/1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) tem como uma das finalidades atenuar a dualidade na educação, fazendo correções de rotas importantes, desconectando a EPT do enfoque de assistencialismo. A LDB,
dispõe sobre a EPT num capítulo separado da Educação Básica, superando enfoques de assistencialismo e de preconceito social contido nas primeiras legislações de educação profissional do país, fazendo uma intervenção social crítica e qualificada para tornar-se um mecanismo para favorecer a inclusão social e democratização dos bens sociais de uma sociedade (BRASIL, 1996).
As Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a EPT, no Art.3º, destacam os princípios norteadores da EPT:
I - articulação com o setor produtivo para a construção coerente de itinerários formativos, com vista ao preparo para o exercício das profissões operacionais, técnicas e tecnológicas, na perspectiva da inserção laboral dos estudantes; (...)
III - respeito aos valores estéticos, políticos e éticos da educação nacional, na perspectiva do pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 2021).
Neste contexto, este trabalho teve como objetivo efetuar uma análise preliminar dos desdobramentos do entendimento de EPT na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT) e no âmbito do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), tendo como pano de fundo a LDB e as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a EPT (BRASIL, 2021).
Metodologia
Esta pesquisa tem abordagem qualitativa. No aspecto metodológico, trata-se de uma pesquisa documental que “implica no levantamento de dados de variadas fontes, quaisquer que sejam os métodos ou técnicas empregadas.” (MARCONI; LAKATOS, 2017, p.202).
Foi efetuada a análise documental de arquivos públicos dos seguintes documentos: LDB, Lei Nº11.892/2008, Resolução CNE/CP Nº1/2021, Decreto-Lei Nº4.048/1942, Decreto-Lei Nº4.936/1942, Metodologia SENAI de Educação Profissional/2019, Relatório de Gestão-Departamento Regional SENAI-RS/2021.
Resultados
A criação do SENAI, por meio do Decreto-Lei Nº4.048/1942, do então presidente Getúlio Vargas, fazia parte da tentativa de industrialização do país através da qualificação da classe proletária. Na ocasião, este foi denominado de “Serviço Nacional de Aprendizagem dos Industriários”; o Decreto-Lei Nº4.936/1942, amplia sua ação e altera seu nome para a designação atual.
A definição de EPT na perspectiva do SENAI-RS é descrita em sua Missão: “Promover a EPT, a inovação e a transferência de tecnologias industriais, contribuindo para elevar a competitividade da Indústria Brasileira” (SENAI, 2020, p.44).
Na Metodologia SENAI de Educação Profissional (SENAI, 2019) é explicitado o conjunto de competências preconizadas aos seus discentes:
Competências Profissionais: Conjunto das Competências Específicas e das Socioemocionais.
Competências Específicas: Conjunto de funções,subfunções e seus respectivos referenciais de qualidade que juntos expressam as principais atividades requeridas para o desempenho de uma ocupação.
Competências Socioemocionais: aptidões que podem ser aprendidas, praticadas e ensinadas. (SENAI, 2019, p.36).
Na visão do SENAI, a formação integral do aluno é denominada como Competências Socioemocionais: “Historicamente, referências nacionais e internacionais de educação preconizam a formação integral do aluno. No âmbito da Metodologia SENAI de Educação Profissional, mapear e incorporar competências Socioemocionais na construção dos Perfis Profissionais” (SENAI, 2019, p.37).
A Lei 11.892/2008 instituiu a RFEPCT e criou os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs). A partir dela, no Art.6o, são delineadas as finalidades e características da RFEPCT:
I - ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades, formando e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional nos diversos setores da economia, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional;
II - desenvolver a educação profissional e tecnológica como processo educativo e investigativo de geração e adaptação de soluções técnicas e tecnológicas às demandas sociais e peculiaridades regionais (BRASIL, 2008).
No que tange à formação integral na RFEPCT, segundo Pacheco (2011), “a Rede Federal não formaria apenas para o mercado de trabalho, mas para o mundo do trabalho; uma acepção mais ampla, de trabalho enquanto fundamento formativo e ontológico da própria condição humana”.
Até o presente momento, as análises comparando a EPT no âmbito da RFEPCT e do SENAI, tendo como norteadora a LDB considerou os seguintes critérios: formação humana integral, inovação e transferência de tecnologia e “competências” profissionais. A síntese desta análise preliminar é apresentada no Quadro 1.
Quadro 1. EPT no âmbito da RFEPCT e do SENAI: excertos oriundos da pesquisa documental
CRITÉRIOS
LBD
SENAI
RFEPCT
EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
III-respeito aos valores estéticos, políticos e éticos da educação nacional, na perspectiva do pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho;
Historicamente, referências nacionais e internacionais de educação preconizam a formação integral do aluno. No âmbito da Metodologia SENAI de Educação Profissional, mapear e incorporar competências Socioemocionais na construção dos Perfis Profissionais, no Desenho Curricular e no desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem não implica reduzir a atenção dispensada às competências específicas, mas contemplar as diversas dimensões do ser humano.
Art.6o Os IFs têm por finalidades e características: I -ofertar EPT, em todos os seus níveis e modalidades, formando e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional nos diversos setores da economia, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional;
INOVAÇÃO E TRANFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
XIX-promoção da inovação em todas as suas vertentes, especialmente a tecnológica, a social e a de processos, de maneira incremental e operativa.
Missão: Promover a educação profissional e tecnológica, a inovação e a transferência de tecnologias industriais, contribuindo para elevar a competitividade da Indústria Brasileira.
Art.7o IV -desenvolver atividades de extensão de acordo com os princípios e finalidades da EPT, em articulação com o mundo do trabalho e os segmentos sociais, e com ênfase na produção, desenvolvimento e difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos.
COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS
IV-Centralidade do trabalho assumido como princípio educativo e base para a organização curricular, visando à construção de competências profissionais, em seus objetivos, conteúdos e estratégias de ensino e aprendizagem, na perspectiva de sua integração com a ciência, a cultura e a tecnologia.
As competências profissionais descritas nos Perfis Profissionais, representadas
pelas funções (unidades de competência), subfunções (elementos de competência) e
padrões de desempenho, são traduzidas para o contexto educacional, estabelecendo,
com clareza e precisão, quais as potencialidades e os desempenhos a serem desenvolvidos
na formação do aluno por intermédio dos processos de ensino e de aprendizagem e que
serão monitorados pelos processos de avaliação.
Art.6o.IV - orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural no âmbito de atuação do IF.
Elaborado pelo autor (2022).
Percebe-se que mesmo possuindo regulamentações diferentes, ambas as instituições têm por premissa buscar uma EPT que atenda os princípios norteadores descritos na LDB, usando termos e concepções diferentes, para a definição de sua atuação.
Considerações finais:
Mesmo que a RFEPCT e o SENAI tenham sido criados em momentos distintos no Brasil, com enfoques diferentes e marcadas pela dualidade estrutural da educação no Brasil, é inegável que elas possuem em comum o mesmo desafio de “Transformar o País através da EPT”, buscando o “fortalecimento das estratégias de colaboração entre os ofertantes de EPT, visando ao maior alcance e à efetividade dos processos de ensino-aprendizagem, contribuindo para a empregabilidade dos egressos” (BRASIL, 2021).
Referências:
BRASIL. Resolução CNE/CP Nº 1 de 5 de janeiro de 2021. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Profissional e Tecnológica, 2021. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-cne/cp-n-1-de-5-de-janeiro-de-2021-297767578>.
BRASIL. Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, 2008. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm
BRASIL. Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm.
BRASIL. Decreto-Lei No 4.048, de 22 de janeiro de 1942. Cria o Serviço Nacional de Aprendizagem dos Industriários, 1942. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/del4048.htm.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. 8.ed. São Paulo, SP:Atlas, 2017.
MOURA, D. H. Educação Básica e EPT: dualidade histórica e perspectivas de integração. Holos, v.2, p.4–30, 2008.
PACHECO, Eliezer. Institutos Federais: uma revolução na EPT. Brasília-São Paulo: Fundação Santillana, Editora Moderna, 2011.
SENAI. Metodologia SENAI de educação profissional. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Departamento Nacional. Brasília: SENAI/DN, 2019.
SENAI. Relatório de Gestão do Departamento Regional-RS, 2021. Disponível em:
<https://www.senairs.org.br/sites/default/files/relatorio_de_gestao_2021_senairs.pdf>.